O processo é uma busca tanto pela inocência quanto pela culpa. Tanto no romance de 1925 quanto no O castelo, escrito em 1922, o tema é evidente.
Um indivíduo, dominado pelo desejo de conhecer algo misterioso, decide-se por uma busca que, de antemão, é malograda. No primeiro caso, tenta compreender labirinto inexpugnável, a justiça, no segundo, o castelo misterioso.
Em ambos, perde-se nua teia burocrática que não tem origem ou não se conhece os seus arquitetos. É essa a busca kafkiana, tentar explicar o inexplicável, daí por que os personagens parecem girar num círculo vicioso sem encontrar o que procuram, espécie de verdade inatingível.
A analogia com O processo parece evidente. No O castelo, K., um agrimensor, chega numa aldeia, inverno rigoroso, neve por toda parte, procura um abrigo num albergue.
No dia seguinte vê, no topo de uma colina, o castelo, bandos de gralhas circulando em torno de sua torre. A busca de K., sem saber, é chegar ao alto, ter acesso ao prédio.
No entanto, seus funcionários, espécie de burocracia labiríntica, não permitem tal façanha. Eles o atiram daqui para ali como se construíssem uma teia complexa, instransponível. Eis o enredo: o herói vai de lado a outro, entre a aldeia e a subida em direção ao castelo. Este mantém-se, para ele, inexpugnável.
O caráter fragmentário é, creio, na obra de Kafka, deliberado. Daí por que até hoje é objeto de reflexões inesgotáveis, abrindo-se a interpretações várias. Não à toa, desde que se passou a notar a importância do autor, depois da Segunda Guerra Mundial, a crítica elaborou as mais diversas interpretações.
Nenhuma pode ser a melhor, a verdadeira ou a única possível, mas todas válidas, embora muitas delas possam negligenciar o texto base em busca de uma filosofia ou de especulações. Eis a crítica feita por Sergio Buarque de Holanda ainda na década de 1950 contra aqueles que iam ao texto do literato apenas para revelar espécie de metafísica escondida.
Nesse caminho, Antol Rosenfeld defende ser necessário abandonar as especulações e estudar Kafka dentro de seu contexto estético, atentando para o texto. Apesar disso, como o castelo e a justiça, não se pode penetrar no íntimo de Kafka para desvendar de uma vez por todas a essência de seus livros.
A obra do autor Tcheco produz impacto artístico como resultado do choque entre a notação naturalista do detalhe, dando-lhe caráter realístico, e o conjunto da fantasmagoria narrada, ou absurdo.
Há aqui uma contradição: estilo objetivo eivado de poesia, arte, do alegórico: o autor diz de um modo para significar outra coisa? Sua linguagem esconde mais do que revela, é produtora de imagens e não histórias?
Continua...
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