Zola é o maior nome do Naturalismo francês e Germinal, publicado em 1885, sua obra-prima, marco dessa nova estética.
O tema do livro é a luta entre o capital e o trabalho, caro e atual no momento em que o autor escrevia a obra.
Retrata uma greve dos mineiros na década de 1860, que viviam de maneira miserável, durante uma crise industrial, precisamente entre os anos de 1866 e 1867, na cidade de Montsou, norte da França, auge de um período de agitações.
Naturalismo
Descontente com a retratação de um mundo idealizado pelo Romantismo, os autores dessa nova estética interessam-se pelas condições de vida precárias das classes menos favorecidas, aquelas na base da pirâmide social.
Tinham em comum com o Realismo a vontade de retratar a vida cotidiana tal como ela se desenrolava aos olhos do literato, cujo exemplo mais acabado é Madame Bovary, de Gustave Flaubert.
Pode-se dizer ser o Naturalismo espécie de tendência extrema do Realismo do mesmo período, com um viés ainda mais detalhista, acreditando na teoria positivista de ser os seres humanos produto das condições ambientais.
Considerando ser possível retratar o mundo tal qual ele se afigurava aos seus olhos, aplicando princípios cientificistas de objetividade, os naturalistas empreendiam pesquisas documentais com o objetivo de retratar, o mais fiel possível, a realidade. Nesse caminho, acreditavam apreender o mundo, o contexto, em que seus personagens agiam.
As classes baixas
Quanto ao social, busca descrever as reações dos personagens retratados em relação ao seu meio vicioso, miserável ou opulento, com destaque para o operariado, a população do meio rural, comerciantes ou a classe burguesa, por exemplo.
Do ponto de vista documental, sua obra apresenta um painel de investigações sobre o mundo dos trabalhadores, daqueles grupos dos excluídos.
Redimensionamento do Real
No entanto, com o seu talento dramático e imaginativo, Zola redimensiona o real, aumentando suas proporções, retratando, com vigor, os atos vis e os maus instintos de seres degenerados.
Suas cenas de sexo, em Germinal, e brutalidades cometidas pela massa mineira enfurecida, por exemplo, horrorizaram uma sociedade burguesas moralista. Teve grande mérito em retratar a multidão e sua psicologia, construtor de cenas fortes e impactantes, com uma linguagem sem rodeios
Germinal
No centro da narrativa está a família Maheu, usada para demonstrar a influência implacável do ambiente e hereditariedade sobre seus membros (dez pessoas).
Pode-se dizer que a mina Voraz é, com seus trabalhadores, um personagem como os outros, espécie de monstro triturador, formigueiro a engolir carne humana, devorando os trabalhadores como se fossem insetos, seres abjetos.
Contexto Histórico
O novo governo proclamou a Segunda República, estabeleceu a liberdade de imprensa e a anistia dos presos políticos. As reformas socialistas incluíram a autorização dos sindicatos, o direito de greve e, sobretudo, a criação das Oficinas Nacionais, idealizadas por Louis Blanc, a fim de solucionar o desemprego e organizar unidades socialistas de produção.
Essas conquistas socialistas acabariam atemorizando a burguesia, que unida a outros setores de proprietários (Igreja, por exemplo), venceu as eleições para a Assembleia Constituinte. Essa vitória eleitoral, em que a maioria dos candidatos socialistas foi derrotada, marca outro período de agitação.
Esse cenário leva ao golpe de estado em 1851 que colocou no poder, no ano seguinte, Luís de Napoleão (1852-1870). Napoleão III governou de forma autoritária até a década de 1860.
Se a progressiva política industrializante avançou, por outro lado, trouxe a miséria para boa parte da classe operária. A partir de 1866, com o fortalecimento da oposição e das críticas, Napoleão III adotou uma postura mais liberal, aproximando-se dos partidos de esquerda e afastando-se dos conservadores, mas, tal postura não se consubstanciou em melhora no campo econômico, e a insatisfação dos trabalhadores, sobretudo com a crise de 1866 e 1867, levou a outro período de agitação e greves entre os trabalhadores.
As Ideias Socialistas e Anarquistas
Em julho de 1870, o governo francês declara guerra à Prússia e a França volta ao regime republicano. O curto período de calmaria dá lugar à agitação. Em 1871 estoura o movimento popular conhecido como Comuna de Paris, duramente reprimido e massacrado.
Após os primeiros momentos, nova fase de avanço, a partir de 1875, sucedendo uma grande crise econômica. Novos distúrbios sociais, acompanhados de desordem política. Era o ano de 1885. Eis o contexto, atribulado, que permitiu a Émile Zola escrever Germinal.
A obra
Enquanto a fome assola as famílias de carvoeiros, a mina de nome Voraz, onde se passa parte dos episódios, condena gerações de trabalhadores a escarrar uma massa gosmenta, preta.
O personagem central, Étienne Lantier, forasteiro que chega à aldeia de mineiros em busca de trabalho e é admitido como carvoeiro na turma do veterano Maheu, incitará os mineiros à organização e luta contra a burguesia.
Sabendo de sua propensão hereditária ao crime, o último de geração de bêbados violentos, ele evita o álcool. Na condição de um estrangeiro, avalia o sofrimento e a injustiça que passa pelos seus olhos.
Com um discurso difuso, misturando máximas anarquista e socialistas, ideias daquele tempo, sonha com novos tempos e arrasta seus companheiros ao sonho de uma sociedade mais justa.
Durante o movimento, perde o controle diante de uma massa enfurecida, sedenta de vingança contra os patrões e os exploradores de sua miséria. O que vemos é uma sucessão de ataques, controladas, depois, pela força policial.
No final, os carvoeiros, vencidos, depois de perdas humanas de meses de penúrias, serão obrigados a retornar ao trabalho, humilhados, e nas mesmas condições de antes. Se o capital acumulou perdas, os trabalhadores serão os grandes derrotados.
Os dramas
A matriarca perde, para fome, uma filha pequena, e para a Voraz, a sofredora Catherine, o marido, que recebe um tiro no peito em uma manifestação, e o filho mais velho. Outro filho, deficientes das pernas, foi vítima de um soterramento.
No final, ela mesma vai trabalhar numa mina para sustentar o avô do marido, velho inválido, e os quatro filhos, três pequenos. Temos a história das meninas frívolas, desvirginadas antes da puberdade, a história de Catherine e Chaval, que a violenta e maltrata, o próprio drama de Étienne que, diante da miséria e brutalidade do meio, querendo fazer algo, ver-se, na maioria das vezes, de mãos atadas.
Aquela população de mineiros, vivendo em promiscuidade em suas casas precárias, condições subumanas de trabalhos, aparece, nas páginas do romance, em muitas cenas, animalizados.
Animalização do ser humano
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Émile Zola (1840-1902) |
Naquelas condições miseráveis, violentas, grassadas pela fome e penúria, os mineiros se animalizam. O narrador utiliza todo um vocabulário para demonstrar isso: eles não dão à luz filhos, “parem”. Eles rosnam, começam no “coito” ou na “cópula” cedo, as meninas ainda antes da puberdade, como Catherine.
As mulheres ficam “prenhas”, como “fêmeas parideiras”, que “procriavam” muito. Nas minas, os garotos “berram”, as operárias “resfolegam, fumegando como éguas sobrecarregadas”.
Para os seios, “tetas”. Alguns não têm narizes, mas “focinhos”. Em suas habitações fazem as necessidades na frente dos familiares sem nenhum pudor, os chefes de famílias namoram sabendo que são vistos pelos filhos, observados entre fechaduras e frestas das portas e janelas.
Naquele mundo parece imperar a lei do mais forte. As mulheres são submissas aos maridos e namorados. Em sua condição de feras exploradas, os operários, em sua maioria, são resignados.
A mina, por sua vez é descrita como um poço devorador, uma garganta que se ramifica como os galhos de uma velha árvore ou um formigueiro, engolindo trabalhadores, espécie de insetos humanos, homens e mulheres animalizados, roendo o carvão como ratos roem as paredes.
A sensação de Étienne ao descer uma mina pela primeira vez revela seu medo e dor diante daquele mundo subterrâneo:
“(...) O poço devorador engolira sua ração cotidiana de homem, cerca de setecentos operários trabalhavam naquele momento dentro do formigueiro gigantesco, perfurando a terra por todos os lados, deixando-a crivada como um velho galho atacado por vermes; E, no meio desse silêncio, sob o peso esmagador das camadas profundas, era possível escutar com o ouvido colado à rocha a vibração desses insetos humanos em movimento, desde o deslocamento do cabo que subia e descia o elevador de extração até a mordida das ferramentas roendo o carvão no fundo dos canteiros de extração”. 44
Fome e penúria: as minas
É lá embaixo, no subsolo, que surge a necessidade de se organizarem para sobreviver, e caberá ao recém-chegado, Étienne Lantier, profetizar novos tempos para a massa de carvoeiros que sufoca debaixo da terra.
Na superfície, após escaramuças e tiroteios, a mobilização foge do controle do líder operário e os mineiros acabam retomando o trabalho para não morrerem de fome. Paralelamente, o niilista russo Suvarin engaja-se em operações de sabotagem de desenlace trágico, culminando com a destruição total da mina. Lantier acaba partindo para Paris, onde trabalhará pela organização dos trabalhadores.
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