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Mulher-anjo |
Eu era um rapaz pobre, tímido demais para viver um grande amor, e estava no Rio havia poucos meses, trabalhando de jornaleiro na Banca de Ipanema. Era tanta gente... tanta gente... indo e vindo, que eu quase enlouqueci, olhando tudo e todos em câmara acelerada! Parecia um jogo de Fliperama, ou eu era Alice... no país das Maravilhas! Onde iria me levar a toca do coelho? Eu não sei! Aquele bombardeiro de sensações..., ritmos..., sons..., cores, era demais para meu cérebro tranquilo de homem do interior. Lembrei de uma canção de Zé Ramalho:
Entre torres e favelas, vejo a Lua flutuar...
Vejo o mar bater nas pedras...
Da cidade onde chorei ... por você...
Foi-se a noite sertaneja, que sonhei no estrangeiro...
Estilhaços de recordação onde eu nunca voltarei...
A cidade é uma serpente...
Se não falha o meu repente... eu vou só...
Toda cidade é uma lenda, tendas de ferro e cristal
Ruas de luz e de penas, cenas de fogo e jornal
Nas esquinas do deserto, as meninas são sereias...
Nas migalhas da televisão eu procuro por você...
São Atlântidas concretas baseadas na pobreza...
Babilônias da desconstrução sob a lama dos meus pés...
As cidades são cometas, vão embora porque somos tão sós.
Ali perto, me disseram depois, tinha uma agência de modelos, e de vez em quando, mulheres lindas... deslumbrantes... apareciam para saber se as revistas nas quais elas haviam posado haviam saído... e vinham... e pediam as revistas: Playboy, Ele/Ela, Capricho... sei lá mais quais!
Sei que, um belo dia, estava eu na banca, como um autômato, num fliperama, vendendo revistas, jornais, cartões postais, fichas telefônicas... e eis que me apareceu um anjo: seus olhos eram radiantes... de um azul celestial... como os olhos de um querubim! Seus cabelos eram longos e loiros... como os cabelos de Iemanjá!
E ela parecia flutuar no ar, como um fantasma! Veio, entrou, parou, caminhou dois ou três passos na minha frente, pegou a revista Playboy. Rasgou o plástico.e disse, com sua voz de anjo, saído dos Jardins do Éden: “Você já viu? Já abriu uma pra olhar?”
Boquiaberto, eu fiz que não com a cabeça... E foi aí que ela – a mulher-anjo – abriu a revista Playboy... bem na minha frente... ergueu o pôster... e perguntou “´Tá bonito?” Eu não pude dizer uma só palavra...! Minhas mãos tremiam... as pernas bambeavam... E a mulher-Anjo falou mais: “Me dê aí mais cinco exemplares!”
Depois disse “Aceita cheque?” Eu fiz que sim com a cabeça... Ela pegou o talão de cheques... inclinou-se sobre o balcão... seu roupão era frouxo... e a cena que eu vi... não era coisa desse mundo! Debaixo do roupão, a mulher-anjo deixou-me ver seus seios... eu quase desmaiei... faltou-me terra nos pés... ar nos pulmões... sangue nas veias!
E enquanto assinava o cheque... olhou para minha cara de bobo... de matuto ingênuo... e deu um sorriso malicioso de canto de boca (como se ela fosse o anjo da perdição!). Depois se ergueu... saiu caminhado da banca... caminhando, não! Flutuando no ar, como um fantasma! E foi-se embora... como uma miragem! É claro que eu iria comprar um exemplar daquela revista! O seu nome? Sinceramente, eu não sei! E nem importa saber!
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