Abin paralela: o uso da inteligência do Estado para fins políticos

Relatório da PF detalha como Carlos, Flávio e Jair Renan foram beneficiados por ações clandestinas da Abin

Por Cleber Lourenço

O relatório final da Polícia Federal no inquérito 2023.0022161 revela a existência de uma estrutura paralela de inteligência montada no interior da Abin, com operações ilegais voltadas não apenas contra opositores e autoridades de Estado, mas também em defesa de interesses privados do então presidente Jair Bolsonaro e de seus filhos: Carlos, Flávio e Jair Renan. A investigação conclui que a chamada “Abin paralela” funcionava de forma organizada, com cadeia de comando definida, padrões operacionais e alvos prioritários.

Carlos Bolsonaro: acesso direto a relatórios e coordenação informal

Carlos é o filho mais diretamente implicado. Segundo a PF, “Carlos Nantes Bolsonaro foi destinatário direto dos produtos da estrutura clandestina da Abin, com objetivo de proteção do núcleo familiar e ofensiva a adversários políticos”. Ele mantinha contato com integrantes da estrutura paralela e tinha acesso a relatórios de inteligência produzidos ilegalmente, com uso do sistema FirstMile. A ferramenta, voltada originalmente ao combate ao crime organizado, foi desviada para gerar dossiês contra jornalistas, magistrados, adversários e servidores públicos.

Carlos é descrito como elo estratégico entre o núcleo político e os operadores da desinformação, orientando linhas de ação e campanhas em conjunto com servidores públicos cedidos. Atuava, ainda que informalmente, no direcionamento das ações da rede clandestina.

Flávio Bolsonaro: neutralização de investigações fiscais

A atuação em benefício de Flávio Bolsonaro é citada como um dos eixos da “Abin paralela”. A PF detalha “monitoramento de servidores da Receita Federal com o objetivo de identificar e neutralizar atuações no âmbito da investigação relacionada ao senador Flávio Bolsonaro”. A apuração sobre o esquema das “rachadinhas” levou a estrutura a monitorar servidores da Receita e tentar influenciar órgãos de controle para impedir avanços nas investigações.

As ações incluíam a obtenção de informações internas da Receita, identificação de delatores e a fragilização da legitimidade dos processos em curso. Para a PF, o uso de recursos da Abin nesse contexto representa obstrução de justiça e desvio de finalidade administrativa.

Jair Renan Bolsonaro: prevenção e proteção antecipada

Com Jair Renan, a atuação teve caráter preventivo. A PF afirma que “a estrutura mobilizou-se para acompanhar investigações e ações administrativas que poderiam impactar Jair Renan Bolsonaro, antecipando medidas para evitar danos”. Houve monitoramento de trâmites envolvendo o Ministério Público, relações empresariais e movimentações financeiras que poderiam afetar sua imagem ou gerar responsabilizações.

A estrutura operava como um sistema de proteção familiar, tratando cada vulnerabilidade como assunto de Estado. Relatórios eram elaborados para antecipar riscos e construir uma estratégia de defesa para o filho mais novo do ex-presidente.

Abin: desvio de finalidade e captura de instituições

O conjunto das ações em favor dos três filhos de Bolsonaro configura um padrão de desvio sistêmico de função pública. O uso da Abin e de tecnologias de inteligência para finalidades pessoais viola os princípios da legalidade e impessoalidade, e é apontado pela PF como parte da captura institucional promovida pelo entorno de Bolsonaro.

A investigação conclui que a estrutura clandestina representava um dos núcleos da erosão institucional que culminou na tentativa de ruptura da ordem democrática. A proteção aos filhos do presidente, embora não constitua crime isolado, integra um esquema de instrumentalização do Estado para fins privados, com efeitos profundos sobre a governança e a legitimidade das instituições.

FONTE; ICL

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