Estava eu no apartamento 202, prédio 848, na praça dos Paraíbas, em Copacabana, quando Pirão chega, e me chama para ir com ele no posto do DETRAN, para passar um carro para o seu nome, ou algo assim.
O DETRAN era a poucas quadras dali. Fomos pela Avenida Atlântica, andando um ao lado do outro, dois “paraíbas” em meio à multidão de gente que ia e vinha naquele logradouro, lá pelas três horas da tarde. E eis que de repente, uma viatura da Polícia Militar sobe na calçada. Dois policias saem de dentro do veículo, sacando suas pistolas, dizendo: “Mão na cabeça! Encosta! Encosta! Encosta! Documento!”
Paralisado, eu fiquei titubeante, procurando saber quem seriam os “meliantes” que os policias vinham abordar! “Encosta! Encosta! Encosta, vagabundos!”, repetiram! Eu ergui os braços, e os depositei sobre a minha cabeça! Um era um policial branco, e outro era um negro! (Infelizmente, eu havia cometido o “crime de esquecer os documentos”)!
O policial branco foi abordar Pirão, já o outro veio em minha direção. Quando eu disse que estava sem meus documentos, os caras enlouqueceram! “Encosta! Encosta! Encosta, vagabundo!” Eu nunca havia sido abordado assim pela polícia, nem no Rio, nem em lugar nenhum! O fato de minha pele ser branca me trouxe esse privilégio! Mas no Rio eu seria um “paraíba”, um “pária social”, alguém membro de uma “sub-raça” e de uma “sub-humanidade”! E para piorar, um membro de uma “sub-raça” que ousou sair de casa sem seus documentos!
O policial negro era enorme, deveria ter mais de um metro e oitenta e cinco! Sua pele era retinta, como a dos homens gigantes do Sudão, e seus olhos amarelos traziam um ódio profundo contra mim! Era o mesmo olhar de um tigre olhando para sua presa! Como se eu fosse algum criminoso que tivesse acabado de cometer crime hediondo, ou algo assim!
Aos gritos, o policial falou: “Tira, tira, tira!”, e eu, sem entender nada, falei: “Tirar o quê, policial?”, e ele: “A camisa, caralho! Tira! Tira! Tira, caralho!”, apavorado, sob a mira daqueles olhos felinos, eu tirei minha blusa e me atirei ao chão. Mas o brutamontes não ficou satisfeito: “Tira! Tira! Tira!” E mais uma vez, gaguejando, eu repeti: “Ti-ti-ti-irar o quê, seu policial?” E ele: “A calça, caralho! Tira a porra da tua calça, caralho!”. Intimidado, eu obedeci, ficando só de cueca, em plena Avenida Atlântica!
Com a pistola na mão direita, o homem disparou um monte de perguntas: “O que tu tá fazendo aqui, caralho? Qual é o teu nome, porra? De onde tu veio, caralho? Vai pra onde, porra? Trabalha em quê, caralho? O que tu veio fazer no Rio, porra? Tu veio de onde, caralho? Qual é o teu nome, porra?” Mal eu tentava respondeu a primeira pergunta, o homem repetia: “O que tu tá fazendo aqui, caralho? Qual é o teu nome, porra? De onde tu veio, caralho? Vai pra onde, porra? O que tu veio fazer no Rio, porra? Trabalha em quê, caralho? Tu veio de onde, caralho? Qual é o teu nome, porra?”. Era o Rio de Janeiro me dando às suas boas-vindas!
Só de cuecas, em plena Avenida Atlântica, sob a mira de uma pistola, debaixo aqueles olhos felinos. Olhei para meu irmão a tempo de vê-lo tranquilo, com o outro policial. Seja lá o que estivesse acontecendo, o problema era comigo! Mas o que eu fiz? Nada! Quem me conhece sabe que eu não sou capaz de fazer mal a uma mosca!
Meu crime era estar ali, na Avenida Atlântica, sem documentos! E é provável que os policiais estivessem procurando alguém! Mas quem? Um homem branco, de cerca de 20 anos, usando óculos, calça jeans, camisa esportiva?! O problema era que havia mais de mil homens assim, que batiam com aquelas características! E o “Jagunço” repetia as mesmas perguntas, como um disco ralado: “Qual é o teu nome, porra? De onde tu veio, cara…
Postar um comentário
Olá! Muito obrigado pelo seu comentário.